O depoimento de Jair Bolsonaro: novidade ou mais do mesmo?

Rodrigo Augusto Prando: Professor e Pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)

| RODRIGO AUGUSTO PRANDO *


O depoimento de Jair Bolsonaro: novidade ou mais do mesmo?

Assistimos, há alguns dias, um dos momentos mais esperados do julgamento que ocorre no Supremo Tribunal Federal (STF), em sua Primeira Turma, acerca dos crimes imputados ao núcleo central do bolsonarismo: o depoimento do ex-presidente Jair Bolsonaro. Provavelmente, o ponto alto será o fim do julgamento com as condenações, as absolvições e as respectivas penas.

Bolsonaro, há dias, fez um chamamento à sua militância para que assistissem ao seu depoimento e asseverou que não haveria lacração. De fato, pela gravidade dos acontecimentos julgados – abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado, para ficar nos mais representativos –, a sessão no STF, presidida pelo ministro Alexandre de Moraes, transcorreu sem maiores sobressaltos. Ficou claro o porquê de o ex-presidente ter mobilizado a sua base: em muitos momentos, em vez de responder objetivamente às perguntas de Moraes, Bolsonaro fez política, defendendo o seu governo, destacando as suas dificuldades e as suas realizações.

O ministro Moraes decidiu inquiri-lo em ordem cronológica. Diferentemente, por exemplo, do General Heleno, que permaneceu em silêncio diante de Moraes e do procurador-geral da República, Paulo Gonet, Bolsonaro respondeu e fez os esclarecimentos solicitados. Politicamente, houve uma clara estratégia de buscar amainar quase sempre ou negar qualquer acusação que lhe é imputada pela Justiça.

Assim, Bolsonaro, quando questionado acerca de suas falas, mormente, dos ataques às urnas eletrônicas e à Justiça Eleitoral, fez questão de enfatizar que não foram ataques, mas críticas, inclusive trazendo à tona as figuras de Flávio Dino e Carlos Lupi, os quais, anteriormente, também haviam criticado o sistema de votação.

Ademais, Bolsonaro afirmou que, não raro, ele usava de uma retórica inflamada, com palavrões, e que isso esteve presente em toda a sua trajetória parlamentar, de vereador até deputado. Inclusive afirmou que, na condição de deputado federal, estava amparado pela imunidade parlamentar e que, talvez, tenha levado essa prática ao Executivo.

Bolsonaro se mostrou humilde, calmo, bem treinado, diferente de sua condição presidencial, cujas ofensas às instituições, às autoridades, aos jornalistas e aos atores políticos eram constantes. Quando Moraes lhe perguntou quais indícios ele teria para afirmar que ministros do STF haviam ganhado milhões de dólares para distorcer as eleições, o ex-presidente pediu desculpas, indicando, assim, que não tinha nenhum indício. Ou seja: era só uma retórica inflamada, segundo a sua concepção.

No que tange às urnas eletrônicas, sabidamente, não foram apenas críticas e opiniões alicerçadas em especialistas, uma vez que até mesmo o relatório com a participação do Exército apresentou um resultado (para desgosto dos bolsonaristas) que não havia fraude e que, portanto, os resultados eleitorais eram legítimos. Bolsonaro insistiu e insistirá nessa tese: as urnas não são confiáveis e podem ser adulteradas.

A questão, no bojo dessa concepção, é que se não bastasse o peso da fala do presidente, de uma liderança política da envergadura de Bolsonaro, houve um conjunto de fake news, pós-verdade e teorias da conspiração produzidas e disseminadas industrialmente, sob a lógica dos algoritmos  das redes sociais, que criou um ambiente propício à ideia de ruptura institucional.

Não tenho – e não pretendo ter – envergadura jurídica para analisar o julgamento. 

Fico aqui nos aspectos políticos. Politicamente, Bolsonaro foi muito habilidoso e, novamente, falou para a sua bolha, que já acredita e o segue firmemente. A questão que fica é se seu depoimento trouxe novidades ou alguma contestação peremptória da acusação. Finalizando, creio que a fala de Bolsonaro é mais do mesmo e que a peça acusatória continua de pé e amplamente desfavorável – e não pela retórica, mas sim pelos fatos elencados na investigação.

* Rodrigo Augusto Prando: Professor e Pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)

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